CADEIRAS VAZIAS? SÓ SE A UNITA TIVER CORAGEM

A oposição angolana manifestou hoje “inquietação” face à marcação de datas para investidura do Presidente da República sem validação dos resultados eleitorais e anunciou a criação de um grupo de trabalho para convocar manifestações que expressem “a repulsa” dos eleitores. Terá a UNITA coragem para implementar a “política de cadeiras vazias”?

O comunicado subscrito por cinco partidos da oposição, UNITA, CASA-CE, PRS, FNLA e Bloco Democrático, salienta que estão a acompanhar o caso junto do Tribunal Constitucional (sucursal do MPLA), face aos recursos de contestação dos resultados oficiais e esperam que este desempenhe o seu papel “de forma patriótica e competente”, procurando “distinguir-se da vergonhosa e serviçal posição” da Comissão Nacional Eleitoral (CNE, outra sucursal do MPLA).

Os partidos sublinham que denunciaram oportunamente as irregularidades praticadas por este órgão e as graves anomalias nos resultados anunciados pela CNE/MPLA, propondo a comparação das actas subscritas pelos delegados de lista e assumem “o direito de prosseguir a litigação noutras instâncias”. Isto se, entretanto, a prontidão combativa elevada das Forças Armadas – imposta pelo seu Comandante-em-Chefe (João Lourenço) – não passar das palavras aos actos.

Manifestam também inquietação pelo facto de estar em curso um programa de investidura do Presidente e vice-presidente da República “com datas marcadas e instituições públicas envolvidas, sem a definitiva validação dos resultados eleitorais pelo TC, o que evidencia uma subordinação dos órgãos judicias ao partido/Estado”.

Os subscritores afirmam também estar atentos “ao clamor e ao sentimento da população”, pelo que decidiram criar um grupo de trabalho “para estudar o quadro e as condições para a organização e convocação de manifestações como expressão do sentimento de repulsa dos cidadãos eleitores”.

Essas manifestações, terão “um carácter estritamente pacífico e ordeiro”, realizando-se em coordenação com os órgãos de ordem pública e “enquadram-se no espírito da ordem constitucional, da lei e do interesse público”.

As Forças Armadas angolanas elevaram o estado de prontidão combativa desde domingo e até 20 de Setembro para evitar incidentes que “perturbem a ordem e tranquilidade públicas”.

Neste período serão reforçadas as medidas de segurança dos principais objectivos económicos e estratégicos e das instituições do Estado, controlo do movimento de colunas militares e restrições na saída de aeronaves militares.

Também a Polícia Militar, em cooperação com a Polícia Nacional, deve intensificar o patrulhamento auto e apeado nos centros urbanos e suburbanos, visando a recolha do pessoal e viaturas militares que contrariem as disposições contidas no despacho.

Colunas de veículos militares e policiais, com carros blindados têm circulado nas principais vias de acesso a Luanda, dando visibilidade às ordens militares.

Na semana passada, o presidente da CNE/MPLA, Manuel Pereira da Silva “Manico”, divulgou numa leitura anedótica e nervosa a acta de apuramento final das eleições gerais de 24 de Agosto e proclamou o MPLA e o seu candidato, o Presidente cessante, João Lourenço, como vencedores com 51,17% dos votos, seguido da UNITA, com 43,95%. Com estes resultados, o MPLA elege 124 deputados e a UNITA 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.

O PRS conquistou dois assentos no parlamento ao somar 1,14% de votos dos eleitores, o mesmo número de deputados que conquistaram a FNLA e o Partido Humanista de Angola (PHA), com 1,06% e 1,02 de votos respectivamente.

A coligação CASA-CE, a APN e o P-Njango não obtiveram assentos na Assembleia Nacional, que na legislatura 2022-2027 vai contar com 220 deputados.

Um dos cenários que se coloca à oposição, nomeadamente à UNITA, é o da política de “Cadeiras Vazias”, que pode ser uma arma poderosa no plano político. Só falta saber se Adalberto da Costa Júnior e os outros dirigentes da Frente Patriótica Unida terão coragem para tal. Têm a força da razão mas o MPLA tem a razão da força.

Lazarino Poulson, jurisconsulto e docente universitário, entende que, “a UNITA tem, segundo os “resultados definitivos” divulgados pela CNE, uma percentagem considerável (43%)— que coloca uma pressão política sobre o partido no poder e, por outro, essa percentagem representa quase metade dos eleitores que votaram nas eleições de 24 de Agosto”, pelo que “a ausência dos deputados eleitos pela UNITA na Assembleia Nacional constituirá um duro golpe à credibilidade das instituições democráticas angolanas”.

“A legitimidade dos dois órgãos de soberania ocorridas nas eleições gerais — Presidente da República e Assembleia Nacional – ficariam seriamente afectas se esse for o caminho de protesto do partido do Galo Negro e dos seus parceiros que formam a Frente Patriótica Unida (FPU)”, opina Lazarino Poulson, salientando que “com essa atitude, a UNITA e a FPU estariam a ser coerentes com as suas reivindicações eleitorais e melhor colocados ficariam para operarem eventuais pressões políticas e sociais sobre o partido no poder”.

Neste cenário, diz Lazarino Poulson, “a luta política far-se-ia por duas vias: a primeira seria a do diálogo que poderia terminar em acordos, e a segunda seria pela via das manifestações e instabilidade política que desembocaria na violência e repressão e ou em uma “revolução”, como observamos em outras geografias”.

“Em todo caso, a eventual ausência dos deputados eleitos pela UNITA na Assembleia Nacional seria um recuo democrático e contrário aos cânones do Estado de Direito, mas também representaria um capital político com relevância diplomática que não se poderia ignorar”, afirma Lazarino Poulson.

Recorde-se que activistas das associações que integram o Movimento pela Verdade Eleitoral (Mover) exortam os deputados a não tomar posse, para não serem declarados “traidores da vontade colectiva”.

Num manifesto apresentado em Luanda instaram a Comissão Nacional Eleitoral (CNE/MPLA) e o Tribunal Constitucional (TC/MPLA), nas vestes de Tribunal Eleitoral, “para que aceitem a vontade colectiva de recontagem dos votos e comparação das actas sínteses em posse de todas as entidades públicas e partidárias” e pedem ao plenário do TC que não valide os resultados eleitorais sem antes atender a este pedido.

Se assim procederam, aceitam “assumir todos os riscos possíveis que advierem dessa inconsequente decisão”, refere o documento, que acrescenta que os deputados resultantes dessas eleições não devem aceitar tomar posse “sob pena de terem de ser declarados traidores da vontade colectiva”, arcando com todas as consequências que “hão-de advir dessa traição à Pátria”, tal como o TC e os comissários da CNE.

O manifesto pede ainda que se indique o embaixador dos Estados Unidos da América para “velar pela veracidade dos resultados eleitorais” e diz que será convocada uma onda de manifestações, caso estas pretensões não sejam atendidas, apelando às forças de segurança que se façam presentes apenas para assegurar o trajecto.

Em declarações aos jornalistas, Joaquim Manuel diz que se trata de uma posição enérgica: “Não podemos admitir que MPLA [partido do poder há 47 anos] continue a governar o país da forma que bem entende”.

Quanto aos deputados, sublinhou que se os resultados são fraudulentos, a sua tomada de posse significa legitimar fraude. Caso se mantenham – sem auditoria independente – os resultados pré-fabricados pela CNE, já há alguns dos deputados eleitos pela UNITA a dizer que não vão tomar posse.

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